NUNCA ANTES NA HISTÓRIA DESTE PAÍS...



Às vésperas de mais uma eleição presidencial, fortemente marcada pela "soberania das vontades", na qual se defendem objetivos privados através da ilegal posse da coisa pública, vivemos um processo de mediocridade existencial do ser humano que o torna cada vez mais despersonalizado em uma realidade sócio-político-cultural incapaz de promover a valorização pessoal do indivíduo, sobretudo, nas lutas por mudanças radicais na configuração política de sua sociedade e no seu próprio modo de ser.

A violenta e obscena campanha eleitoral que está sendo travada no Brasil é, antes de tudo, o reflexo transparente de um comportamento político comum a todos os segmentos partidários em que a maioria dos brasileiros não anseia, de fato, pela transformação do sistema, mas, tão somente pela manutenção de privilégios, de benesses ou até mesmo de migalhas que possam obter após a eleição que, assim, é transformada em um contrato, utilizado por aqueles que governam para alcançar a legitimidade de mandar, obrigando o cidadão ou a cidadã que os elegeram como representantes a simplesmente obedecer.

 Dessa forma, temos a invasão da esfera pública pela esfera privada, onde o povo abre mão da participação política pública em favor de uma estrutura institucional-partidária legitimada pelo pleito e constituída por um aparato de especialistas que atribui a si mesmo a capacidade exclusiva de governar. É exatamente nesse vicioso cenário que a atividade política é, corriqueiramente, reduzida à satisfação e administração dos interesses privados, ameaçando, portanto, de extinção a esfera pública em seu caráter de comunidade plural e de prática cidadã.

O país, então, passa a ser governado, seja pela ditadura, seja pela democracia, sob a diretriz de um regime único, no qual as decisões não são discutidas coletivamente, mas apenas aplicadas sem qualquer questionamento e, o que é pior! onde o abuso do poder por parte dos governantes desvia os mesmos de sua original função de administrar a coisa pública para o público, instaurando, paralelamente, a ditadura do privado e o exercício perverso da corrupção com o "auxílio luxuoso" do próprio povo, transformado em uma ridícula massa que deseja abarcar tudo aquilo que estiver ao seu alcance.

Esta massa, na realidade, nada mais é do que um conjunto de homens e de mulheres, apequenados pelo império do ter, que apenas desejam se tornar senhores, mas que nunca serão, de fato, porque não têm por ideal modificar as bases políticas da nação, mas, somente clamam pela obtenção de benesses sociais que ampliem seu poder de consumo e a consequente satisfação material de seus interesses privados. Em tal massa inexiste, portanto, a verdadeira solidariedade entre seus membros, posto que a ânsia de crescimento social é o fim único que justifica seus atos amorais e desprovidos de ética.
Cabe ressaltar que não são apenas as pessoas de baixo poder aquisitivo ou de pouca instrução educacional que compõem essa indistinta massa; mas também todos aqueles, sejam letrados, ricos, de qualquer raça ou credo religioso, que não podendo, ou não querendo, agir criticamente, dependem sempre de "autoridades externas" que exerçam sobre eles influências diretrizes. Traduzindo: As pessoas vinculadas à massa são adeptas do famoso ditado: "Manda quem pode...”!

Representando um caminho a ser seguido ou um pretenso facho de luz, estes líderes carismáticos, na verdade, perpetuam as trevas da ignorância não somente ao alienar o povo, mas, ainda, porque tais condutores, tidos como Pai dos Pobres, Mitos ou Salvadores da Pátria que invariavelmente discursam em nome de Deus, da Pátria ou da Família, não se reconhecem na vida periférica dos oprimidos e dos trabalhadores, sempre explorados pela ganância dos corruptos e poderosos.

Sem apresentar natural espontaneidade, a massa, em suas ações, apenas segue estímulos intensos produzidos por demagogos que possuem a habilidade de catalisar as aspirações coletivas, principalmente, no que diz respeito à satisfação dos desejos ditados pela moda e à ânsia de poder que tanto assola as pessoas em nossos obscuros dias.

Em ambas as situações há uma evidente falta de racionalidade crítica. O povo transforma-se, desse modo, em uma turba que além de não possuir propósitos honestos que possam construir a transformação social e política da realidade vigente ainda colabora com a própria opressão do Estado plutocrático; ou seja, aquele que se estrutura na influência ou no poder do dinheiro e no mandato das classes mais abastadas da sociedade.

Seduzido pela propaganda enganosa de seus senhores, o homem-massa não ousa externar seus anseios individuais; porém, em suas ações, que jamais realizaria individualmente, talvez, nunca tenha se perguntando se realmente pensa da maneira que defende determinadas causas nas manifestações políticas ou públicas. Curiosamente, muitos dos políticos, interessados apenas em "se arrumar" ou em promover convulsões sociais, nem sequer aparecem nas manifestações, mas, sempre, utilizam a fanática massa como bucha de canhão para seus propósitos pessoais ou políticos.

Cega, infelizmente, pelo seu próprio ódio, atirado em todas as direções, a massa, apesar de seus muitos membros letrados ou eruditos, torna-se ainda mais ignorante, à medida em que consome informações provenientes dos meios de comunicação, sobretudo das redes sociais, que muito embora  proporcionem um acúmulo de informações, não  garantem aos massificados maior consciência ou lucidez.

Lembremos, de passagem, o que prega o filósofo Paulo Freire: a educação não é exercício de depósito de informações como se fosse um banco; mas, um processo que possibilita usar a informação, partindo sempre de uma análise crítica, para operar sobre a realidade.

Explorado, no entanto, em sua ingenuidade coletiva, o homem-massa não é capaz de perceber que só tem serventia para seus demagogos líderes ou para outros agitadores políticos enquanto faz passeatas, protestos ou manifestações, muitas vezes, seguindo uma unanimidade que nem sempre é pensada; ou, ainda, desfilando para exaltar seus opressores como pioneiros, heróis e até como se fossem "deus", isto tendo sempre como finalidade  comover a opinião pública.

Tradicionalmente, logo após a tomada ou a chegada ao poder, a massa é imediatamente descartada pelo grupo político usurpador que, todavia, adota uma clássica postura advinda do fascismo ao endeusar um líder populista e dar a ele a fama de homem que sabe agir, que tudo resolve. Ao mesmo tempo esse governo coloca os marginalizados e os oprimidos como exemplo de êxito político; isto graças à sua inegável capacidade de influenciar, de forma radical, as massas urbanas. Tal prática "nunca antes na história desse país" foi tão marcante...! E nem tão real.

Filadélfia Bahia, 14 de Outubro de 2018. 

Por Valter Silva

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