‘Parem de atirar, somos músicos’, relembra cantora sobre ação policial que matou dançarina; sanfoneiro segue internado

Por G1 BA

Vocalista da banda, Joelma Rios, relatou como crime aconteceu — Foto: Reprodução/Instagram

“Atiraram para matar. Eu nunca passei por isso”, diz Joelma Rios, de 44 anos, vocalista da banda cearense Sala de Reboco, sobre a ação policial que deixou ela e o sanfoneiro do grupo feridos, além de causar a morte da dançarina da banda.

O caso ocorreu na madrugada desta sexta-feira (5), em Irecê, e também estavam no carro outra dançarina do grupo e o motorista do veículo.

Joelma foi atingida nas nádegas e de raspão no braço. Após receber atendimento, foi liberada do hospital. Ela conta que apesar de perceber que se recupera bem, o sentimento de tristeza toma conta dela e de todos da banda.

“Imprudência. Infelizmente perdemos nossa companheira, Gabi, de 25 anos, era uma menina maravilhosa, tão meiga, nossa companheira. A gente vai voltar sem ela, a família esperando. Ela fazia de tudo um pouco, costurava, era cabeleireira, vivia batalhando. No período do São João, a gente organizou uma turma e chamou ela [Gabriela] para completar a equipe”, relatou Joelma, que está há três anos nos vocais da banda.

Dançarina morreu após abordagem policial na Bahia — Foto: Reprodução/Instagram

Emocionada, a cantora relembrou o momento da ação que causou a morte de Gabriela. Ela contou que as marcas dos tiros estavam no carro e na sanfona de Eliedelson Possidônio Júnior, que foi atingido na perna.

“Gabi saiu com a mão na barriga, dizendo que estava sentindo dor. E ele [Possidônio] disse que não sentia a perna, a panturrilha dele ficou esfacelada. Foi horrível”, disse.

Gabriela e Possidônio foram socorridos para o Hospital Regional de Irecê. A dançarina não resistiu aos ferimentos. Já o sanfoneiro corre o risco de perder a perna.

Joelma relatou que ela e os demais foram surpreendidos pelos tiros e que não houve qualquer sinalização policial para abordagem, como sinal de luz ou funcionamento do giroflex. Na ocasião, foi notado pelas dançarinas que um carro estava seguindo eles, mas que o grupo não viu que era viatura, pois as luzes estavam baixas.

“As meninas [dançarinas] perceberam e falaram: ‘Tem alguém seguindo a gente’. Para desviar seguimos por outras ruas da cidade e chegamos a achar que não tinha mais ninguém nos seguindo. Até que tinha um carro atravessado na rua, no escuro e só ouvimos os disparos. Assustado, o motorista acelerou. Cada um tem uma reação diante de um caso desconhecido”, relembra.

“A gente não sabia que era a polícia. Foi tudo muito rápido”, contou.
Por meio de nota, a Polícia Militar informou que o Comando de Policiamento Regional da Chapada (CPR) instaurou um Inquérito Policial Militar (IPM) que vai apurar as circunstâncias da ocorrência. Disse ainda, conforme informações da Companhia Independente de Policiamento Tático (CIPT)/ Rondesp Chapada, que o carro da banda seguia na contramão.

Disse que o carro furou dois bloqueios feitos pela polícia e que foram encontradas garrafas de bebidas alcoólicas no interior do automóvel. A Polícia Civil também informou que vai apurar o caso.

Joelma nega que havia garrafa de bebida alcoólica no carro e que estavam na contramão. Disse também que não houve nenhum bloqueio policial.

“Se a gente tivesse furado o bloqueio, os tiros teriam sido no fundo do carro, mas os disparos também foram na frente do veículo. Possidônio [sanfoneiro] foi atingido e estava sentado no banco da frente do carro. Vieram tiros de frente e não foi de imediato que percebemos que foi a polícia. Se a gente notasse que era uma abordagem policial, nós teríamos parado porque não devemos nada a ninguém e não estávamos cometendo qualquer crime”, contou.

Joelma também relembrou que após os disparos ela teve a reação de abrir a porta do carro para que os policiais vissem quem estava no veículo.

“Eu saí do carro gritando e com as mãos para cima: ‘Parem de atirar, somos músicos, somos trabalhadores. Parem pelo amor de Deus’. Foi aí que eles pararam. Daí eu vi que Gabi tinha sido atingida. As testemunhas se assustaram. As pessoas começaram a sair das suas casas. Espero que isso não fique impune por uma atitude impensada. Me senti uma ladra de alta periculosidade, me senti um lixo, passar por tudo isso, por alguém que deveria nos dar segurança”, concluiu.

Carro onde estavam os integrantes da banda Sala de Reboco ficou cheio de marcas de tiros — Foto: Arquivo Pessoal


Depoimento de irmão

Gleidivaldo Possidônio, irmão do sanfoneiro Eliedelson Possidônio que ficou ferido na ação policial na Bahia, conversou com o G1 e contou como recebeu a notícia de que o irmão estava ferido.

“Foi um susto. Eu recebi a notícia por volta das 4h20 da manhã. Eu estava dormindo. O Tonhão [Dono da banda] me ligou e contou sobre a situação”, relatou.

Gleidivaldo, que é médico, disse que a família do sanfoneiro, que mora em Fortaleza, avalia a possibilidade de transferência do músico. Como ainda não há nada definido para viagem de Eliedelson, é a mãe dele que se prepara para vir à Bahia.

“Já entrei em contato com o hospital para avaliar a transferência. Ele está esperando a avaliação do angiologista para poder ser liberado para a transferência para fortaleza. O estado de saúde dele é estável, mas ele teve fratura na tíbia e fíbula e fratura exposta na parte direita. Eu entrei em contato com o colega que está acompanhando ele, ele disse que há risco de amputação. Mas estamos aguardando a avaliação de um angiologista. Ele corre o risco de ter a perna amputada”, explicou.

O irmão da vítima ainda disse que o sanfoneiro foi atingido por um tiro de rifle. “É um tiro de grande impacto. É um risco muito elevado para amputação. Fraturou dois ossos da perna. Há o risco”, contou.

Gleidivaldo destacou que uma situação como essa nunca aconteceu com o irmão dele. “Ele é um cara de bem. Tinham ido confraternizar. Foi a primeira vez que aconteceu isso. Foi um completo despreparo da polícia. Ele tem dois filhos, crianças de colo, um tem três anos tem um ano”, disse.

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